25/08/2017 06h20
Cen?rios - O desafio da m?sica
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A maioria dos músicos que conheço reclama do declínio da qualidade musical em todo o planeta. Quais seriam as razões dessa queda?</p>
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Bem! Os consumidores de música não são especialistas. São leigos, quase sempre desafinados disritmicos e contam com os artistas para o que não conseguem fazer, que é oferecer músicas para todas as horas.</p>
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Só que não precisam ser exatamente músicas de qualidade. Precisam apenas ser adequadas. Já houve um tempo em que os artistas compunham suas óperas ou peças clássicas e a nobreza ficava confortavelmente sentada em silêncio ouvindo.</p>
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O artista era protagonista dos shows. Só que a coisa mudou. Os shows migraram dos teatros para os clubes. A música que era pra ouvir, passou a ser música pra dançar também.</p>
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As bandas de baile começaram a acumular o descomunal arquivo de músicas chakundum do planeta. Primeiro os ritmos pra dançar juntos, boleros, fox, samba canção, até que chegamos ao pop. Os shows migraram dos clubes para os estádios e grandes espaços.</p>
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Mesmo assim os músicos continuaram protagonizando e vários estilos foram aparecendo e desaparecendo. O público ainda apreciava ver grandes performances de músicos como Jimmi Hendrix, Ed Van Hallen, Deep Purple, só pra citar alguns. Não era uma música feita para dançar, mas para o deleite intelectual, uma espécie de celebração do engenho musical humano.</p>
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Os músicos geniais eram muito valorizados. Mas ai o marketing tratou de enquadrar. Catalogaram gêneros e subgêneros e foram desdobrando: música romântica, música sensual, música pra praticar esportes, música pra consultório de dentista, rock progressivo, heavy metal, rockabilly, eletrônica, funk, sertanejo universitário e por aí vai. O pop tratou de criar um formato radiofônico padrão. As músicas não poderiam passar de 2 minutos pra sobrar mais espaço para os comerciais.</p>
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Os solos de guitarra e harmonias sofisticadas foram banidos. Imperativo era fazer músicas de 3 acordes, com refrão e mais uma parte, sem solos virtuosos, tão infantil como a mente da média. Claro que existe uma pequena casta de artistas geniais que consegue sobreviver fazendo o que gosta. Mas quando falta comida na mesa, quando falta dinheiro pra pagar a prestação do carro, despesas com o bebê que está vindo, o artista tem de engolir o orgulho musical e se adequar ao gosto geral pra sobreviver. Por isso temos tantos bons músicos, principalmente do rock tocando música sertaneja. De repente o cara gosta de jazz, arrasa no improviso. Pode ser um grande guitarrista ou baterista de rock. Mas quando a coisa aperta, tem de botar um chapéu de cowboy, uma bota agulhinha e entrar na onda do sertanejão. A não ser que tenha uma profissão paralela que lhe garanta o sustento. Nesse caso a música vai ser a sua peladinha de final de semana, apenas pelo prazer. Não há demérito nenhum nisso.</p>
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Carlos Drummond, nosso poeta maior, ganhava seu sustento como funcionário público. Com isso podia dedicar-se a fazer poesia de qualidade, sem concessões. Esse poderia até ser um caminho possível para quem faz música autoral. O problema é que fica caro alugar espaço, contratar músicos e som. Além do mais há uma competição cruel e só os mais aptos sobrevivem ou conseguem vitrines pra expor seus trabalhos e conquistar o verniz da fama. A batalha para os autorais é inglória, uma vez que os contratantes, com raríssimas exceções, só contratam covers que levam até o estabelecimento os consumidores que se identificam com as bandas famosas.</p>
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O público também dificilmente sai de casa para assistir shows com músicas desconhecidas de artistas sem fama. E pra piorar ainda mais, em tempos de download pirata está cada vez mais difícil faturar com direitos autorais. O que fazer então? Quem souber a fórmula me avise. Dizem que o que é bom encontra um jeito de brilhar no mundo. Só que bom hoje em dia é o que tá na moda, tá na mídia e dá dinheiro. O quantitativo esmaga o qualitativo sem dó.</p>