01/08/2014 08h09
Cen?rios - Almas Tortas
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ENQUANTO ISSO NUM CEMITÉRIO...</p>
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- Ei...você...cadê o pessoal que tava aqui agora?</p>
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- Uai...foram embora. Acabou o enterro...</p>
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- Enterro de quem?</p>
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- Não sabe mesmo, inocente?</p>
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- Não...</p>
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- O seu enterro. Você morreu.</p>
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- Morri? Mas como se estamos aqui conversando?</p>
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- Uai. Não acreditava em espírito, em alma?</p>
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- Ah...sei lá. Achava que essa coisas eram só invenções humanas pra enganar a morte.</p>
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- Não existe morte, meu amigo. Existe passagem.</p>
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- E o que acontece agora?</p>
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- Ah...sei lá. Durante um tempo você pode virar assombração, andar no meio dos vivos.</p>
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- Assombração? Fantasma mesmo?</p>
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- Sim. É divertido. Os vivos morrem de medo.</p>
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- Mas me explique uma coisa. E os outros mortos?</p>
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- Bom, uns encarnam depressa, outros ficam na terra durante um bom tempo.</p>
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- E as pessoas enterradas aqui no cemitério?</p>
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- A maioria já reencarnou e tá na terra de novo.</p>
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- E você? Por que não reencarnou?</p>
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- Ah...me cansei de ficar nesse encarna-desencarna. Decidi ficar por aqui mesmo..</p>
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- Mas não sente saudades da carne? Do sexo, por exemplo?</p>
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- Rapaz, até que não. Mas outro dia, acredita que um casal pulou o muro e veio transar aqui dentro? Em cima dos túmulos?</p>
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- É mesmo? Caramba hein. Dá tesão mesmo.</p>
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- A moçada gosta de viver perigosamente.</p>
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- E essas garrafas de cachaça e velas pretas?</p>
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- Pois é...isso aí funciona.</p>
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- Como assim?</p>
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- É o seguinte. Alguns podem até não ter saudades de sexo. Mas sentem saudades da marvada.</p>
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- Sério?</p>
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- E o pior é que alguns entram no jogo da macumba. Começam a fazer malvadezas em troca de pinga e um pouco de farofa. Um jeito de matar saudades da matéria.</p>
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- Eu já prefiro o sexo. Será que vem um casalzinho aqui hoje?</p>
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- Nada. Isso é raro. Mas você agora é um espírito. Pode sair por ai xeretando todos os casais.</p>
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- É mesmo? Que legal. Hoje mesmo então vou ver se flagro alguns...</p>
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- Mas me diga uma coisa. Como você morreu?</p>
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- Sei lá. Eu tava numa boa. De repente tive uma dor forte no peito e apaguei.</p>
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- Infarto fulminante. Jovens infartados costumam não se salvar mesmo.</p>
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- Mas eu não tinha nada. Saúde de ferro. Fumei muito no final da adolescência, bebi um bom tanto também, mas já faz tempo.</p>
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- O lixo acumulado no organismo cobrou a conta.</p>
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- Foi duro ver minha mãe chorando, meus amigos, minha ex namorada...</p>
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- Bom.Você pode descer e ver como estão. Mas te prepara pois é doloroso. Eles vão te puxar pra baixo. E tem outra. Dentro de pouquíssimo tempo esquecerão de você e tocarão suas vidas.</p>
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- Você é pessimista, hein?</p>
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- Eu sou é realista. Mas pelo menos sou bem humorado. Mas me diga uma coisa. Vai querer reencarnar logo? Retornar à carne?</p>
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- Ah...não sei. Acho que vou ficar por aqui um pouco. Vou me divertir um pouco. E você? É uma assombração de cemitério? Mora por aqui?</p>
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- Aqui no cemitério? Que nada. Estava aqui por acaso. As vezes me dá saudade desse lugar e retorno pra ver como estão as coisas. Viajo direto. Gosto de viajar no trem da vale, de avião. Já dei a volta ao mundo umas 1000 vezes.</p>
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- Sério?</p>
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- Claro!</p>
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- Mas há quantos anos você está assim...sem reencarnar?</p>
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- Uns 500 anos...</p>
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- Mas por que isso? As instâncias superiores deixam?</p>
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- Já ouviu falar em livre-arbítrio? Ninguém é obrigado a nada. A gente volta quando quiser. Eu enjoei desse negócio de começar de novo, infância, adolescência, juventude, senilidade e morte. Mas já fiz muita coisa boa no passado.</p>
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- E qual o seu nome mesmo?</p>
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- É Paulo Moreira...(quem é de Alvinópolis vai entender)</p>