04/04/2014 10h04
Cen?rios - MEDO DE QU??
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Estava na rodoviária de Monlevade esperando a hora da saída do ônibus para BH, quando aproximou-se uma pessoa e perguntou se eu era Marcos Martino que escrevia no jornal Bom Dia. Falei que sim! A pessoa falou que lia sempre a minha coluna e perguntou se poderia sentar-se para batermos um papo. Ele praticamente me entrevistou:</div>
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- Martino. Você tem medo da morte?</div>
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- Da morte não. Tenho medo é da obsolescência.</div>
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- De obso...o quê?</div>
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-bsolescência...medo de ficar obsoleto, ultrapassado.</div>
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- Ah...mas você está sempre se atualizando, é moderno...</div>
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- Que nada. As culturas vão sendo substituídas, novas tintas são utilizadas. Já viu aquelas paredes que a gente vai descascando e percebe que existiram várias camadas antes?</div>
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- Mas você é um cara antenado nas novas tecnologias, na internet.</div>
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- Mais ou menos. Aprendemos a viver num mundo analógico, linear. Já trabalhei com as excelentes máquinas Remington de datilografia. Já utilizei máquinas de calcular de manivelas. Escutei música nos velhos toca-discos de vinil. Depois tive walkmans que utilizavam fitas k7. E tudo ficou obsoleto. Temos outro mundo hoje.</div>
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- Pra você, o mundo tá pior ou melhor?</div>
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- Não sei dizer. Parece que as pessoas tem uma vida mais confortável, que todos são mais bem informados, que a tecnologia iguala as pessoas, mas sei lá. Sinto que as coisas estão mais superficiais.</div>
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- Como assim superficiais?</div>
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- As pessoas leem pouco, ouvem músicas sem se aprofundar nas letras e nos arranjos, não conseguem enxergar valor artístico em um quadro ou em uma dança, enfim, só tem valor o que é popularesco.</div>
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- Mas não seria uma dessas crenças do tipo "antigamente é que era melhor?"</div>
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- Pode ser. Pelo menos estamos vivendo essa época de transição e por isso temos como comparar. Os que nascem hoje em dia não tem nem parâmetros para comparações.</div>
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- Você tem medo do tempo?</div>
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- Tenho arrepios é quando ouço a palavra idoso. </div>
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- Mas não acha bom ter mais experiência, mais sabedoria?</div>
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- Sabedoria para entender que já não protagonizamos nada. Somos figurantes no mundo que é dos jovens. Além do mais, essa palavra idoso já carrega em si uma despedida.</div>
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- Como assim?</div>
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- Idoso é posição daquele que já foi, um ser ido...e que está indo pro cemitério. O famoso pé na cova</div>
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- Você prefere melhor idade?</div>
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- Prefiro nada. Hipócrita demais. Melhor idade é dos 15 aos 26. O resto é relação.</div>
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- E sobre a morte?</div>
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- Inexorável...ainda se tivéssemos certeza sobre o que vem depois...</div>
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- Mas não acredita na vida após a morte ?</div>
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- Se houver sairemos no lucro. Se não houver, não teremos tempo de nos arrependermos por termos acreditado.</div>
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- Mas você não acredita em Deus?</div>
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- Acredito sim. Acho que existe um princípio ordenador e a humanidade sempre intuiu a presença do sagrado. Só não sei qual a cara, o nome, a pátria de Deus.</div>
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- E sobre política? Em quem você vai votar para a presidência da república.</div>
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- Olha lá, meu ônibus chegou...tenho de ir...valeu a conversa, hein? Tchau...</div>
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- Peraí...e a minha pergunta?</div>
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- Vamos fazer o seguinte? Falar de música, de cultura, filosofia, de poesia. Pra falar de política já tem gente demais. </div>
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- Vai fugir do pau?</div>
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- É claro. Do pau eu quero é distância. Basta o meu. </div>
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- Não entendi...</div>
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- Até mais...e continue lendo a coluna...e se der, vamos interagir na internet. Tchau...</div>