02/12/2016 13h10
Medio Pira - Cleber Camargo - um itabirano s?ntese
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Cléber Camargo Rodrigues é um itabirano síntese, apaixonado pela palavra, pela cultura em geral, gosta de se misturar aos artistas da música, conhece suas glórias e dores, sempre dialogando com os afins, movendo projetos e mais projetos, ativista, guerrilheiro cultural, sonhador e realizador, colunista, produtor zen, mas inquieto, exigente, mas sedento de novidades. Logo que comuniquei ao Editor do Jornal que pretendia entrevista-lo, ele já citou o projeto Meninos de Minas, que entre tantos projetos, notabilizou o Cléber como produtor diferenciado, que consegue mover importantes projetos culturais e mantém uma postura otimista perante as mudanças, uma espécie de couraça poética pra sobreviver com arte. Mas vamos à entrevista...</p>
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<strong>– Você é poeta, produtor, gestor cultural, escritor. Entre tantos ofícios qual é o dominante?</strong></p>
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Acho que ser ajuntador de sonhos é o que caracteriza minha vida, minha sina. Em tudo que faço há uma pontinha de sonhos. Escrever uma poesia ou um projeto é um exercício de sensibilidade que permeia cada um de meus dias. De forma igual, produzir um evento ou gerenciar uma entidade ou projeto carrega a mesma necessidade. Esta sensibilidade vale pra toda atividade humana, mas costuma ser mais explícita no campo da cultura e das artes.</p>
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<strong>– O que você acha da poesia em tempos virtuais? Acha que a internet banaliza ou depura a partir da quantidade?</strong></p>
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A internet democratiza tudo e oportuniza a difusão de uma forma de arte e de agir. Nas redes virtuais, todo mundo pode ser o que quiser e até mesmo ser o que não é. Muita coisa boa aparece e surpreende. Muita coisa de qualidade duvidosa aparece e surpreende também. A possibilidade está diante de todos. Cabe a cada um achar o filtro próprio. Estamos todos a um clique do sonho ou do pesadelo virtual. É uma questão de escolha daquilo que serve ou não pra cada um de nós.</p>
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– Você é uma pessoa que construiu uma parte da sua história num mundo ainda analógico. Hoje é tudo digital. Como você trabalha isso? Atualizou-se ou tem dificuldades com esse novo mundo?</p>
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Eu tenho uma grande dificuldade com a tecnologia, com a vida digital. Minha filha pequena costuma encurtar alguns caminhos que eu não consigo caminhar sem embolar a cabeça. Pra falar a verdade, eu sou quase uma ‘anta digital’, mas eu ainda não desisti.</p>
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<strong>– Você foi superintendente da Fundação Carlos Drummond de Andrade. Quais foram seus orgulhos e frustrações dessa época?</strong></p>
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A oportunidade é tudo para o ser humano. Eu tive uma oportunidade de ouro. A alegria maior é a certeza que nossa equipe fez o melhor e colheu frutos deste empenho. Conseguimos contribuir pra história de nossa terra. A frustração ficou no passado, como ficam algumas das melhores lições da vida. Foi tudo muito intenso, como deve ser um trabalho na área cultural. As alegrias superaram as frustrações. Lembro com carinho da intensa programação do Centenário de Carlos Drummond de Andrade, criação do projeto Drummonzinhos, reconstituição da Fazendo do Pontal, restauração e aquisição da Casa de Drummond, ônibus Biblioteca Drummond Sobre Rodas, Seminário Internacional de Produção Musical, Seminário Cultural do Sudeste (preparatório para o Fórum Cultural Mundial), festivais de inverno, lançamentos de livros e CDs, regulamentação da Lei Drummond de Incentivo à Cultura, Fórum Luso-Brasileiro, entre tantos outros. Passa um filme na gaveta da memória, quando penso na alegria de nossa equipe a cada desafio vencido.</p>
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<strong>– Vemos a tecnologia assumindo funções antes executadas por seres humanos em todas as áreas. Acha que isso vai chegar ou já chegou as artes?</strong></p>
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Já chegou com força, mas tem espaço pras coisas que são feitas à unha, na raça, sem tecnologia. Há diálogos possíveis e necessários, mas há espaço em que uma coisa não condiz com a outra. É preciso achar o que valoriza sem descaracterizar. Sem afrontar a raiz.</p>
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<strong>- Sobre a cena musical atual, você consegue garimpar coisas boas, no meio de tanta poluição musical?</strong></p>
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Todo dia, acho artistas fantásticos. A poluição não alcança meus sentidos. Eu procuro ouvir coisas novas pra reciclar os desejos e a vida.</p>
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<strong>– Como você vê a cena itabirana da atualidade? E do Médio Piracicaba?</strong></p>
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Itabira está lotada de gente com condições de ganhar os palcos do mundo. Há muita qualidade e muitas novidades boas nesta terra Drummondiana.</p>
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O Médio Piracicaba também tem uma série de artistas realizando um trabalho com muita competência. Conheço alguns, mas acho que é preciso encurtar a distância que temos de Itabira às outras cidades da região. É uma situação muito parecida com o que acontece entre o Brasil e a América Latina. Somos parte, mas ainda não compartilhamos e somamos da forma que poderíamos.</p>
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<strong>– Na questão da poesia. Acha que continuará a sobreviver no papel ou seu caminho também é a nuvem e o universo virtual?</strong></p>
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O livro não acabará nunca. O universo virtual ajudará a popularizar a poesia nossa de cada dia. Um dia, a poesia será mais oral que impressa ou virtual. A poesia ainda será incorporada à cesta básica de necessidades humanas e terá lugar na sala de ser e de amar de todos nós.</p>
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<strong>– Sobre as leis de incentivo. Não acha que tem burocracia demais para que um artista consiga viabilizar sua arte?</strong></p>
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A burocracia não é demais. Precisamos formar mais produtores, gestores e administradores culturais para dar vazão a tanta arte carente de espaço e difusão. Alguns artistas precisam de produtores. Outros dão conta de fazer a própria produção – por talento ou por necessidade.</p>
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<strong>– Quais são os seus projetos do momento? Em que está envolvido na atualidade?</strong></p>
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Estou produzindo um CD dos Meninos de Minas. Tenho sonhando em dedicar à poesia uma parte maior do meu tempo. É um projeto, é uma parte dos sonhos que carrego no meu embornal da cor de burro fugido.</p>
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<strong>– Seu trabalho é mais concentrado em Itabira ou atua em outras freguesias também</strong></p>
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Ao longo de quase quarenta anos de produção cultural, tenho tentado construir algumas pontes fora de Itabira, em outros países e cidades. Acho que nenhuma cidade, do tamanho ou menor que a nossa, consegue consumir tudo que produz na área cultural. O público consumidor ainda é pequeno. É preciso outros caminhos e mercados pra ampliar os horizontes. Vou tentando achar estas possibilidades pra fortalecer o que fazemos aqui. Quase sempre, a vida é uma tentação, mas há alegrias plurais nesta caminhada.</p>