09/05/2014 10h53
Cen?rios - Eu amo vo...
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Ele sempre pegava o trem em Belo Horizonte pra fugir da 381 e desembarcava em sua cidade, algumas horas depois. Ele se considerava um sujeito de sorte por vivenciar a experiência de viajar de trem, um travelling por uma região maravilhosa que ele amava. </div>
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Naquela manhã ele não encontrou passagem de trem. Era a segunda vez que ia direto pra estação e não encontrava passagem. O trem tava ficando concorrido demais. Teve de caminhar um pouco até a rodoviária e comprar passagem para a sua cidade. Ele já sabia. Poderia comprar passagem para daí a 45 minutos. Aproveitou para sentar-se numa das mesas próximas ao café, que tem tomadas pra ligar os notebooks e dá pra usar a internet numa boa. </div>
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Deu uma conferida no facebook, nos emails e ficou ali ouvindo o sotaque da mineirada do sul e do norte. </div>
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A Rodoviária é ponto de encontro dos capiaus com seus sotaques. Uma covardia tirarem a rodoviária dali. Fico imaginando os matutos do interior, que apeiam ali na meiuca de Belo Horizonte e saem pela cidade olhando o tamanho dos prédios. Eles vão perder essa referência. Terão de descer lá nas lonjuras. </div>
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Será que BH quer rechaçar os caipiras? Será que BH tem vergonha de suas origens? Vai saber. </div>
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Mas a Rodoviária pulula de vida. Quem ouve de longe deve imaginar uma colmeia. </div>
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Ele tomava seu café quando a locutora avisou que daí a 5 minutos saia seu ônibus. Quando ajeitava pra sair, apareceu uma pessoa com a qual não falava há anos. Ela vei puxando papo e ele querendo ser educado. A amiga ainda teve tempo de registrar um selfie pro face. Ele despediu-se e desceu a escada correndo. </div>
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Olhou o número da poltrona. Número 7. Ele não gostava de ir na frente, mas foi esse número que a vendedora de passagens lhe passou e ele nem conferiu. </div>
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Ele pegou seu mp3 player e ligou. Queria ouvir as notícias na Bandnews. Ele gostava de música e hoje só queria ouvir notícias. Sinais da idade avançando. </div>
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Ele acomodou-se e ficou observando a paisagem, o ônibus seguia devagar. Ligou o smartphone e nada de sinal de internet. Tédio. </div>
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Resolveu pegar a pasta de trabalho pra escrever qualquer coisa, quem sabe uma poesia. Ficou com a caneta na mão, mordeu a tampa, olhou para o papel em branco esperando que a inspiração viesse. </div>
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Mas o que veio mesmo foi um caminhão na contra-mão. O impacto foi violento e ele veio a falecer. Em sua mão foi encontrado um bilhete escrito: Eu amo vo.</div>
